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Caldas da Rainha - Passado Presente e Futuro

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Abrangência Literária...






















….«Lembremo-nos que a literatura, porque se dirige ao coração, à inteligência, à imaginação e até aos sentidos, toma o homem por todos os lados; toca por isso em todos os interesses, todas as ideias, todos os sentimentos; influi no indivíduo como na sociedade, na família como na praça pública; dispõe os espíritos; determina certas correntes de opinião; combate ou abre caminho a certas tendências; e não é muito dizer que é ela quem prepara o berço aonde se há-de receber esse misterioso filho do tempo - o futuro. ….»

Antero de Quental, in 'Prosas da Época de Coimbra'

Hier Encore - Charles Aznavour

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Efeitos da Leitura e da Vida...























….«Quando leio um livro tenho a impressão de lê-lo somente com os olhos, mas de vez em quando deparo com trecho, talvez apenas uma frase, que tem uma significação para mim, e ele torna-se parte de mim; tirei do livro tudo o que me é de alguma utilidade, e não posso extrair mais, ainda que o releia uma dúzia de vezes.
Veja, parece-me que cada um de nós se assemelha a um botão de flor fechado, e a maior parte do que lê e faz não faz efeito nenhum; mas há certas coisas que têm uma significação particular para a gente, e elas abrem uma pétala; e as pétalas abrem uma por uma, e no final a flor está aí. …»

Somerset Maugham in 'A Servidão Humana'

Gilbert Bécaud - L'important c'est la rose

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Julgar Pelas Aparências…






















…«A beleza é uma forma de Génio... diria mesmo que é mais sublime do que o Génio por não precisar de qualquer explicação. É um dos grandes factos do mundo, como a luz do sol ou a Primavera, ou o reflexo nas escuras águas dessa concha de prata a que chamamos lua. É inquestionável. Tem um direito de soberania divino. Eleva os seus possuidores à categoria de príncipes. Está a sorrir? Ah, quando a tiver perdido com certeza que não há-de sorrir... às vezes as pessoas dizem que a Beleza é apenas superficial, e pode bem ser. Mas pelo menos não é tão superficial como o Pensamento. Para mim, a Beleza é a maravilha das maravilhas. Só as pessoas frívolas é que não julgam pelas aparências. O verdadeiro mistério do mundo é o visível e não o invisível...»

Oscar Wilde in 'O Retrato de Dorian Gray'

The Beach Boys - Don't Worry Baby

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Cortejo Ingénuo dos Nossos Sonhos...


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…«Não desenhamos uma imagem ilusória de nós próprios, mas inúmeras imagens, das quais muitas são apenas esboços, e que o espírito repele com embaraço, mesmo quando porventura haja colaborado, ele próprio, na sua formação. Qualquer livro, qualquer conversa podem fazê-las surgir; renovadas por cada paixão nova, mudam com os nossos mais recentes prazeres e os nossos últimos desgostos. São, contudo, bastante fortes para deixarem, em nós, lembranças secretas que crescem até formarem um dos elementos mais importantes da nossa vida: a consciência que temos de nós mesmos tão velada, tão oposta a toda a razão, que o próprio esforço do espírito para a captar a faz anular-se.

Nada de definido, nem que nos permita definir-nos; uma espécie de potência latente... como se houvesse apenas faltado a ocasião para cumprirmos no mundo real os gestos dos nossos sonhos, conservamos a impressão confusa, não de os ter realizado, mas de termos sido capazes de os realizar. Sentimos esta potência em nós como o atleta conhece a sua força sem pensar nela. Actores miseráveis que já não querem deixar os seus papéis gloriosos, somos, para nós mesmos, seres nos quais dorme, amalgamado, o cortejo ingénuo das possibilidades das nossas acções e dos nossos sonhos….»

André Malraux in 'A Tentação do Ocidente'

Beach Boys - California Dreaming

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Um ERO na Tropa e um Carnaval nos Pimpões

Em 1964 estava no Regimento de Infantaria 5 um Cabo Miliciano de nome João Ramos Franco


Sendo natural da cidade e estando de Sargento de Ronda à mesma no sexta-feira de Carnaval, não tinha muitas hipóteses de passar despercebido à hierarquia militar.

Vai daí, a única saída era o Bairro Além da Ponte, local que naquele tempo pouca malta da cidade frequentava e enfia-se com a Ronda no Baile dos Pimpões.
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Quando entrei, a malta não me reconheceu devido ao capacete militar, “torceram o nariz”, mas mal eu o tiro vem a festa: olha é João (o filho do Veterinário).
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Nesse tempo o Bar era logo à esquerda de quem entrava, eu assentei arraial logo aí, paguei uns copos aos Soldados que estavam de serviço comigo e disse:
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- Vão até à sala divertir-se, que fico aqui com estes amigos…
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- Nosso cabo Miliciano, as armas e o capacete? - perguntaram os Soldados.
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- Dêem cá isso, guarda-se atrás do balcão do Bar, estes amigos não se importam! -respondi eu, pedindo para me guardarem também a pistola.
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Dançaram-se meia-dúzia de músicas, beberam-se uns copos e ala para o quartel, que a última entrada era à 01h00…
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João Ramos Franco

C O M E N T Á R I O S no Blog do ERO
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Julinha disse...
Os dias vão passando e já lá vão 2 anos que conheci e comecei a contactar com o João R Franco. Sempre me pareceu uma boa pessoa...e vou confirmando isso mesmo, à medida que o tempo passa.
Naquela época, além de tentares festejar o Carnaval como te era possível, não esqueceste os soldados que te acompanhavam em serviço!
Quando comecei a ler, pensei....apanharam todos um castigo, esqueceram a hora de entrada. Enganei-me, o João, muito responsável, chegou a horas !E este Carnaval não vais aos Pimpões ? Que te divirtas....
Um abraço
Júlia
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Luís disse...
Os Pimpões eram realmente muito longe das Caldas, não eram? Lembro-me de lá ver pouca gente do E.R.O.
História engraçada e que mostra que a tropa nunca é para levar completamente a sério!!!
BOM CARNAVAL!
Luís
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Cachaça não é água

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Carnaval com Vinicius de Moraes




















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“Felicidade”

Felicidade
É o meu carnaval
Quanto toda essa luz e cor
E o amor é natural

Felicidade
É o samba que eu fiz
E que ouço feliz a cantar
Esse povo infeliz

Abre os teus braços
Vem brincar nos braços meus
Hoje é só no faz-de-conta
No carnaval não existe adeus

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“A felicidade”

Tristeza não tem fim
Felicidade sim

A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranqüila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor

A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei ou de pirata ou jardineira
Pra tudo se acabar na quarta-feira

Tristeza não tem fim
Felicidade sim

A felicidade é como a pluma
Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve
Mas tem a vida breve
Precisa que haja vento sem parar

A minha felicidade está sonhando
Nos olhos da minha namorada
É como esta noite, passando, passando
Em busca da madrugada
Falem baixo, por favor
Pra que ela acorde alegre com o dia
Oferecendo beijos de amor

Vinicius de Moraes in Poesia completa e prosa: "Cancioneiro"

samba do poeta - vai levando - tristeza (a felicidade)

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A Crónica de Jornal...

















Eça de Queirós

...«A crónica é como que a conversa íntima, indolente, desleixada, do jornal com os que o lêem: conta mil coisas, sem sistema, sem nexo, espalha-se livremente pela natureza, pela vida, pela literatura, pela cidade; fala das festas, dos bailes, dos teatros, dos enfeites, fala em tudo baixinho, como quando se faz um serão ao braseiro, ou como no Verão, no campo, quando o ar está triste. Ela sabe anedotas, segredos, histórias de amor, crimes terríveis; espreita, porque não lhe fica mal espreitar. Olha para tudo, umas vezes melancolicamente, como faz a Lua, outras vezes alegre e robustamente, como faz o Sol; a crónica tem uma doidice jovial, tem um estouvamento delicioso: confunde tudo, tristezas e facécias, enterros e actores ambulantes, um poema moderno e o pé da imperatriz da China; ela conta tudo o que pode interessar pelo espírito, pela beleza, pela mocidade; ela não tem opiniões, não sabe do resto do jornal; está nas suas colunas contando, rindo, pairando; não tem a voz grossa da política, nem a voz indolente do poeta, nem a voz doutoral do crítico; tem uma pequena voz serena, leve e clara, com que conta aos seus amigos tudo o que andou ouvindo, perguntando, esmiuçando.
A crónica é como estes rapazes que não têm morada sua e que vivem no quarto dos amigos, que entram com um cheiro de Primavera, alegres, folgazões, dançando, que nos abraçam, que nos empurram, que nos falam de tudo, que se apropriam do nosso papel, do nosso colarinho, da nossa navalha de barba, que nos maçam, que nos fatigam... e que, quando se vão embora, nos deixam cheios de saudades.»...

Eça de Queirós in 'Distrito de Évora'

Leonard Cohen "Democracy"

domingo, 7 de fevereiro de 2010

O Facto e o Direito...






















…«O direito é a justiça e a verdade. O característico do direito é conservar-se perpetuamente puro e belo. O facto, ainda o mais necessário, segundo as aparências, ainda o melhor aceite pelos contemporâneos, se só existe como facto, contendo pouco ou nada de direito, é infalivelmente destinado a tornar-se, com o andar dos tempos, disforme, imundo, talvez até monstruoso. Se alguém quiser verificar de um só jacto a que ponto de fealdade pode chegar o facto, visto à distância dos séculos, olhe para Maquiavel. Maquiavel não é um mau génio, nem um demónio, nem um escritor cobarde e miserável; é o facto puro. E não é só o facto italiano, é o facto europeu, é o facto do século XVI. Parece hediondo, e é-o, em presença da ideia moral do século XIX.
Esta luta do direito e do facto dura desde a origem das sociedades. Terminar o duelo, amalgamar a ideia pura com a realidade humana, fazer penetrar pacificamente o direito no facto e o facto no direito, eis o trabalho dos sábios.»….

Victor Hugo in 'Os Miseráveis'

Submarino Amarelo disse:
Conheço uns políticos a quem devias mandar este texto ... e daí talvez não, não sei se eles o compreenderiam

Sans la Nommer - Georges Moustaki

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

- Realidades do Sonho…
















…..”O sonho é a explosão dos súbditos na ausência do rei. Se o homem fosse um ser único, não sonharia. Mas cada um de nós é uma tribo em que somente um chefe tem os privilégios da vida iluminada. O chefe é a pessoa reconhecida pelos semelhantes, o «mim» legal da sociedade e da razão, obrigado a uma concordância fixa consigo mesmo. Só ele tem relações expressas com o mundo exterior e o único a reinar nas horas de vigília. Mas abaixo dele há um pequeno povo de cadetes expulsos, de insurrectos punidos, de hóspedes indesejáveis - exilados da zona da consciência, mas donos do subconsciente, encerrados no subterrãneo, mas prontos para a evasão, vencidos mas não mortos. Há a criança que foi renegada pelo jovem, o delinquente imobilizado pela moral e a lei, o louco que todos os dias estende armadilhas à razão raciocinadora, o poeta que a prática condenou ao silêncio, o bobo dominado pelas amarguras, o antepassado bárbaro que ainda se recorda do machado de pedra e dos festins de Tiestes.
O eu quotidiano e vulgar, o respeitável, o vigilante, o vitorioso, dominou essa tribo de larvas inimigas, de irmãos renegados e moribundos. E como a alma tem o seu subsolo, escuridão palúdica encimada pela varanda iluminada da consciência, mantém encerrados lá em baixo os intempestivos e preocupantes rivais. Às vezes, conseguem emergir, no meio-dia do eu dominante, mas por breves momentos - em particular, quando o homem está só consigo mesmo, sem testemunhas, e faz e diz coisas estranhas que evitaria diante dos companheiros. Em certas ocasiões, um deles consegue derrubar para sempre o chefe legítimo, e o homem, em virtude dessa revolução triunfante, torna-se assassino, louco ou génio - por vezes santo. “

Giovanni Papini in 'Relatório Sobre os Homens'

The Platters - Twilight Time